Novo estatuto não agrada aos alunos mas é bem recebido por pais e professores
23.07.2010 - 08:16 Por Graça Barbosa Ribeiro
Onde os estudantes vêem factores de exclusão, os mais velhos descobrem mecanismos de responsabilização, que valorizam a aprendizagem.
Os representantes das associações de pais e de professores respiraram ontem de alívio com a aprovação do novo Estatuto do Aluno, que vem substituir a versão em vigor desde 2008. Agrada-lhes o reforço da autoridade dos docentes e dos directores, a valorização da aprendizagem, a agilização das medidas disciplinares e a responsabilização dos estudantes. Já estes vêem as mesmas alterações ao documento de uma perspectiva diferente. E consideram que, com a aprovação do novo estatuto pela Assembleia da República, ontem, “se deu mais um passo para afastar os alunos da escola”.
“Quer um exemplo? O novo estatuto prevê que os alunos tenham de pagar o material que estragam. Isto é pedagógico? Não é. Se um aluno partir um vidro e for obrigado a pagá-lo, no dia seguinte parte outro e dois dias depois outro ainda. Porque a obrigação da escola não é castigá-lo, mas explicar-lhe por que é que não deve andar a partir vidros”, comentava ontem, indignado, Luís Encarnação, estudante.
"Ganho civilizacional"
Luís não conhecia ainda a versão definitiva do documento que acabara de ser aprovado com votos favoráveis do PS e do CDS-PP e contra dos restantes partidos. O facto de ser porta-voz da Associação de Estudantes da Escola Secundária Gil Vicente, em Lisboa — que, por sua vez, é co-representante da Delegação Nacional de Associações de Estudantes do Básico e do Secundário —, obrigara-o, contudo, a manter-se a par das novidades. “O objectivo parece ser afastar os alunos das escolas”, lamentou.
Mais um exemplo: Luís Encarnação concorda com a distinção entre faltas justificadas e injustificadas mas não aceita que, ultrapassado o limite, o aluno seja sujeito “a um único plano individual de trabalho e não a todos quantos necessitar”. Também contesta a possibilidade de suspensão por um dia dos estudantes sem abertura de processo disciplinar, em situações excepcionais, um “factor de exclusão” que diz ser “contraditório” com os deveres da escola de “educar e integrar”. Do ponto de vista dos pais, as mesmas medidas, precisamente, são positivas. “Globalmente, o novo estatuto representa um ganho civilizacional: ao responsabilizar alunos e pais valoriza-se a escola e a aprendizagem e acaba-se com o sentimento de impunidade que começava a instalar-se entre os estudantes”, elogiou ontem Albino Almeida, da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap).
Maria José Viseu, da Confederação Nacional Independente de Pais e Encarregados de Educação (CNIPE), também se disse, “de uma forma genérica, satisfeita”. Vê no documento “o fim a uma cultura do facilitismo cómoda mas seriamente prejudicial aos estudantes”.
Os representantes das duas associações de directores escolares, Pedro Araújo e Filinto Lima, não quiseram pronunciar-se, por desconhecerem o documento. Mas João Grancho, presidente da Associação Nacional de Professores, já tinha opinião formada: “Este estatuto devolve à escola o estatuto de autoridade e volta a responsabilizar os pais e, principalmente, os alunos, que estavam conscientemente a tirar partido da existência de mecanismos que lhes permitiam, em qualquer circunstância, ter aproveitamento sem um esforço mínimo.”
Três ideias-chave
Faltas que dão “chumbo”: Regressa a distinção entre faltas justificadas e injustificadas. Ultrapassados os limites destas últimas, o aluno é sujeito a um plano individual de trabalho. Em caso de insucesso, o director ainda pode propor um percurso escolar alternativo, mas se continuarem as faltas injustificadas o aluno fica retido.
Maior responsabilização: Quando é atingida a metade do limite de faltas injustificadas, os pais ou encarregados de educação são chamados a colaborar numa solução que permita garantir o cumprimento do dever de assiduidade. Se tal for impraticável, a escola deve alertar a Comissão de Protecção de Crianças e Jovens.
Disciplina mais célere: Vão desde a simples advertência, uma medida que é recuperada e passa a poder ser aplicada também pelo pessoal não docente, à transferência de escola. A suspensão preventiva passa de um máximo de cinco para dez dias e, em casos excepcionais, o director pode suspender o aluno por um dia antes da abertura do processo disciplinar.
► PÚBLICO [23.07.2010]
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