Nas mãos de crianças que ainda dão pontapés no português e na matemática, os computadores portáteis são uma desgraça: servem para brincar, e não para aprender. Este efeito é reforçado em crianças de famílias pobres.
Henrique Raposo (www.expresso.pt)
9:00 Quinta feira, 12 de Agosto de 2010
I. Aqui há uns tempos, os iluminados do Ministério da Educação decidiram que o passo que faltava na estrada dourada do progresso era a distribuição de computadores. Com um passe de mágica — financiado pelos contribuintes, claro está — transformaram todas as criancinhas da escola primária em orgulhosos proprietários de personal computers. A igualdade material era o elemento que faltava para o sucesso trans-classista. O estado intervinha com uma prenda azul, e permitia que todos pudessem ser o Steve Jobs lá da rua.
II. A bem da verdade, a tentação não foi exclusivamente portuguesa. Outros países aderiram ao mesmo raciocínio fácil: “distribuem-se computadores, brotam bons resultados”. Entretanto, os factos vieram estragar esta utopia tecnológica. Recentemente, dois economistas de universidades americanas publicaram um estudo sobre o impacto dos computadores nos resultados escolares, focando-se em particular na Roménia. Conclusões? Miúdos que mexem em computadores ganham jeito para... mexer em computadores (ganham especialmente jeito para jogos, acrescente-se). Mas, atenção, as técnicas informáticas são apenas isso: técnicas. Se não souber escrever, se não souber raciocinar, um miúdo de 10 anos não sairá da cepa torta mesmo que seja o campeão mundial do “power point”.
III. Pior: o estudo indica que as crianças mais desfavorecidas, em regra com pais menos escolarizados, saem pior do experimentalismo educacional. No caso romeno, tiveram piores notas a matemática e à língua materna, agravando ainda mais o fosso que já as separava dos meninos de classe média.
IV. Com tudo isto, é de esperar que o Ministério da Educação tire a devida lição: experimentar com crianças em idade escolar é profundamente errado, e pode arruinar-lhes o futuro. Se uma criança não souber calcular um troco simples, não vai ser o computador a tratar disso por ela. O computador é uma “técnica”, um “instrumento” que está a jusante. A montante está a “essência”: os conhecimentos, a capacidade de escrever, o raciocínio matemático. O “Magalhães” e afins são fraudes pedagógicas, porque metem o carro à frente dos bois.
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