quinta-feira, 27 de agosto de 2009

José Gil: «Há muitos professores que gostam de ensinar»


Eis um extracto da entrevista de José Riço Direitinho a José Gil, publicada na revista LER n.º 83, respeitante a Setembro de 2009

E o que provocou depois um decréscimo tão notório de popularidade? O desgaste da imagem, as histórias que circularam, a célebre «campanha negra», a corrupção...

Acho que sim, tudo isso. Mas houve uma mudança que não tem ainda explicação. Uma mudança a cerca de dois terços da legislatura Sócrates. Ou porque os media deram uma importância muito maior aos casos de corrupção, e começou-se a ver que a corrupção era um factor estrutural da nossa sociedade financeira, económica, etc. O facto de se ser suspeito para a colectividade significa que não há fumo sem fogo. E os casos Freeport, BPN e BPP, que ainda não acabaram, contribuíram para isso. Por outro lado, a política da educação, sempre apoiada, reiterada e caucionada pelo primeiro-ministro, contribuiu para o enorme desgaste da imagem. Porquê? Porque cem mil, e depois 140 mil pessoas na rua não são apenas estes indivíduos... Implica a multiplicação por uma série de factores, porque há a família, os amigos, os conhecidos, etc. Foram muito mais do que aquela centena de milhar os que foram afectados pela intolerável e inadmissível política de humilhação. De uma humilhação que não foi apenas de comportamento, de atitude pessoal da ministra e dos secretários de Estado relativamente aos professores, com frases sobre o «professorzeco» e coisas dessas. Foi a incrível dita «burocracia» que foram obrigados a seguir, que implica o esmagamento da profissão e a falta de respeito pela pessoa dos professores. Não é uma apenas uma atitude. É o número de papéis, de coisas, a impossibilidade de ensinar... Há muitos professores que gostam de ensinar.

Apesar das tentativas de não resposta às manifestações, a tal «ausência do alvo» de que fala no livro…

Mas é ausência de uma resposta a uma acção. Eu digo menos no livro do que aquilo que se passa. É uma coisa delirante, pós-kafkiana. Os professores já não podem ir a um colóquio sobre problemas do ensino ou da pedagogia ― que têm directamente a ver com a sua profissão ― sem uma autorização difícil de obter. Coisas dessas. O resultado é milhares de professores que deixaram a profissão. E foram, possivelmente, muitos dos melhores. Quando há professores de Filosofia que fazem cursos profissionais de baby-sitting, isto fala não só pela Filosofia mas pelas transformações. Não tem sentido.

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