A opinião de Rui Baptista, de Coimbra, publicada na secção CARTAS AO DIRECTOR do jornal PÚBLICO de hoje.
Em jeito de introdução, começo por referir uma opinião do notável ensaísta Eduardo Lourenço: "Os portugueses vivem em permanente representação, tão obsessivo é neles o sentimento de fragilidade íntima inconsciente, e a correspondente vontade de a compensar com o desejo de fazer boa figura, a título pessoal."
Ora esse desejo assumiu carácter colectivo no caso da atribuição de diplomas de mérito e prémios pecuniários aos alunos do 12.º ano por parte do Governo, polemizado pela audição de várias personalidades ligadas à problemática da Educação, conforme consta de um artigo de Sara R. Oliveira (11.09.2008) transcrito no Portal da Educação - Educar (11.09.2008).
Mas falemos, apenas e por agora, da entrega de diplomas de mérito que exaltam o esforço dos alunos. Embora bastante crítico publicamente para com determinadas medidas emanadas do Ministério da Educação, não alinho no coro maniqueísta de um certo sindicalismo de bota-abaixo em considerar que todas as decisões emanadas da 5 de Outubro são más ou mesmo péssimas.
Assim, em defesa daquilo que tenho como um combate à mediocridade de um ensino que iguala desiguais, sem ter em conta o valor de uns e a mediocridade de outros, tenho esta medida como possível e desejável tentativa no combate ao facilitismo que grassa no ensino nacional, proscrevendo o secular legado de Erasmo de Roterdão: "A principal esperança de uma nação reside na educação apropriada da sua juventude"! Ademais, busco respaldo confortável numa figura grada da nossa cultura, o falecido ensaísta António José Saraiva, quando critica o mau trato dado às elites, porque "assustam muitos democratas por julgarem que as sociedades podem ser superfícies rasas". Aliás, idêntico procedimento deve ser contestado numa avaliação rasa dos docentes que não tenha na devida conta que os professores não são todos iguais em capacidade de trabalho e entrega à profissão. Distingue-os vários níveis de competência na forma como exercem o seu múnus, definidos, com rara felicidade, por William Arthur Ward: "O professor medíocre diz, o bom professor explica, o professor superior demonstra e o grande professor inspira." Será justo utilizar uma bitola avaliativa que não penalize "o professor medíocre" e valorize "o professor que inspira", como sendo ambos farinha do mesmo saco?
Não descortinando nesta cerimónia oficial "razões para o alarme catastrófico dos sindicatos", mas, crítico q.b. para com o verdadeiro show-off que proporcionou a um cortejo de ministros e secretários de Estado do Partido Socialista que a ela se associaram, escreve Manuel de Carvalho, em editorial, intitulado "O mérito na escola e o demérito da encenação": "Que haja prémios, quadros de honra e de excelência, que se leve os alunos a perceber que o trabalho, a dedicação e o esforço são reconhecidos é uma coisa; que se faça com o seu sucesso uma encenação triunfal é um erro crasso, que se pode reflectir nas estatísticas do insucesso. Que é, afinal, o problema mais grave da educação no país" (PÚBLICO, 13/9/2008).
A um ano de eleições e em época de declarada crise nacional do sistema educativo, uma medida que podia e devia ser digna de "uma pingadeira de glória", como diria Eça, descambou, ad nauseam, em sessões de propaganda eleitoral orquestradas por altas figuras de Estado do Partido Socialista no ambiente propício das escolas portuguesas de ensino secundário com muitos jovens em idade de votar ou que para lá caminham.
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