É essa revolução – podem também chamar-lhe reforma profunda, pois o resultado é o mesmo – que está em curso no nosso país. Ela implica, como todas as revoluções, muito esforço, muita controvérsia, muita luta séria, mas também muitos golpes traiçoeiros de exploração do medo, de mistificação da realidade, de descredibilização das medidas que lhe dão corpo, de resistência à mudança.
Mudança nas infra-estruturas, com a reabilitação do parque escolar que durante décadas foram deixando degradar; modernização dos equipamentos e recursos didáctico-pedagógicos (que falta faz a tanta gente a “culpa do sistema e a “falta de condições”); transformações profundas do perfil dos projectos educativos, com a valorização das vias vocacionais e o crescimento dos alunos que os frequentam e por isso já não abandonam precocemente a escola; o aprofundamento do trabalho em áreas chave como o português, a matemática e as ciências verificado ao mesmo tempo que se diversificam as iniciativas de educação nas áreas das expressões, da saúde, do empreendorismo, do ambiente e da cidadania; a criação da escola a tempo inteiro e a oferta de actividades de enriquecimento curricular no primeiro ciclo; o apoio especial dado às escolas confrontadas com problemas mais graves por via do Programa TEIP, a criação de um movimento social de grandes proporções e muito trabalho no domínio da educação/formação de adultos, eis alguns exemplos da matéria de que é feita a revolução do sistema de educação/formação.
Mudanças, também, no campo das condições para sustentar todas as outras: a gestão dos recursos. Sem elas não se podiam alcançar os resultados que estão a ser alcançados – crescimento do número de alunos, melhoria geral dos resultados escolares, adesão de centenas de milhares de adultos às novas oportunidades, quase tantos alunos do secundário nas vias científico-humanísticas como nas vias vocacionais, para apenas citar alguns dos principais impactes da actual revolução na educação. Por isso decorre o processo de autonomização das escolas, reforçando a característica de “serviço de proximidade” do ensino/aprendizagem; por isso se estruturou a profissão de professores criando a categoria de “professor titular” a quem são atribuídas tarefas adequadas à senioridade; por isso se introduziu a avaliação para que as progressões deixem de ser automáticas e cegas em relação à qualidade dos desempenhos e aos méritos de cada um. Os milhares de professores e agentes educativos que, embora por vezes confusos, não embarcam no movimento contra-revolucionário, provam que muitos percebem que essa distinção tem de ser operada para que a qualidade do ensino/formação ganhe espaço.
Claro que esta revolução, como todas as revoluções, tem os seus inimigos. Desde logo, os poucos – mas com vozes ampliadas pelos órgãos de comunicação social – que beneficiavam do subdesenvolvimento e das baixas qualificações umbilicalmente ligadas aos baixos salários; depois, os que detinham o monopólio do acesso a qualificações escolares relativamente raras. Parecendo por vezes colocados em campos opostos, partilham mais interesses do que se supõe, razão pela qual aos conservadores de direita se juntam os conservadores ditos de esquerda, derrotados quando o país escolheu o modelo europeu. Acrescente-se-lhes aqueles que se julgavam definitivamente instalados num sistema que permitia todo o tipo de regalias sem exigir nenhuma contrapartida mensurável no plano dos resultados do seu trabalho. Compreende-se, assim, a actual turbulência à volta da educação. Ela é, por assim dizer, inevitável.
Neste momento a controvérsia e a contestação anda à volta da avaliação dos professores. Mero pretexto para fazer regredir todo o processo de modernização que está em curso. Neste quadro, as alegadas questões técnicas do “modelo de avaliação do Ministério da Educação”, não passam de “fumaça”. A maioria delas, aliás, foi deliberada e artificialmente fabricada para lançar a suspeição sobre a medida, incendiar o país e criar o pânico. Qualquer especialista em recursos humanos subscreveria esse modelo e os muitos exemplos de uma correcta aplicação do modelo provam-no.
O que está em causa, de facto, não é nem um problema técnico do modelo da avaliação, nem o estilo da governação. O que está em causa é saber se um governo legitimamente eleito pode ou não realizar uma reforma do maior alcance estratégico, sem ceder aos interesses corporativos e/ou políticos de sectores capazes de se mobilizar para paralisar a mudança e manter privilégios ilegítimos.
(Fonte: Canhoto)
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