A política do governo Pinto de Sousa em relação à Escola Pública pode resumir-se a um objectivo claro: empresarialização das escolas tuteladas pelo Ministério da Educação.
O primeiro-ministro, embora seja líder de um partido cujo nome ainda ostenta a palavra socialista, acredita que o modelo que melhor serve o desenvolvimento das organizações de serviço público assenta numa gestão de tipo empresarial, hierarquizada e tutelada de perto pelo Estado. Trata-se de uma espécie de capitalismo de Estado do qual ele não abdica e que, no caso das escolas, vai levar à sua paralisia a breve prazo, uma vez que os professores não podem aceitar tal transformação por comprometer definitivamente o bem público da educação com qualidade para todos.
Entender estes aspectos permitirá perceber porque nada mudou na relação entre os professores e o ministério, apesar do simplex avaliativo anunciado há dois dias.
É que o governo apenas cedeu no que para ele é acessório, preservando o essencial da sua política educativa, procurando dessa forma dividir as hostes que o afrontam para mais facilmente continuar a reinar. Já sabíamos que seria assim, tal como temos perfeita consciência de que os assessores políticos de Pinto de Sousa dormem com Maquiavel à cabeceira.
Vejamos então de que é que o governo não abdicou e o que é que cedeu:
Não abdicou:
- da hierarquização da profissão;
- de continuar a criar uma casta de gestores, afastando progressivamente alguns professores da leccionação para o exercício de cargos de direcção;
- de aplicar os princípios da distribuição normal de Gauss a uma organização que devia ter por missão fazer explodir a normalidade estatística, para alcançar a excelência generalizada;
- do princípio das quotas;
- da ideia de contenção de custos com pessoal, mesmo que para isso tenha que impedir administrativamente o reconhecimento do mérito de muitos milhares de professores.
Por outro lado, abdicou:
- da avaliação formativa, que a retórica apresentava como a melhoria da escola pública, ao prescindir da observação do trabalho lectivo;
- da diferenciação do mérito e do demérito, ao propor um Bom “encapotado” para todos (bastará estar presente para ter essa classificação).
Além disso, apresentou presentes não exequíveis, sabendo (ou devendo saber) que não há mudanças não aplicáveis a meio do ano lectivo, sem que isso implique um grave prejuízo para as aulas:
- aumento do tempo disponível para os avaliadores, que implica reestruturação dos horários dos próprios e dos colegas que os substituírem nas tarefas que deixarem de exercer;
- escolha de avaliador da mesma área científica, que além dos eventuais problemas de reestruturação de horários a meio do ano, tem ainda um problema a montante – a inexistência de titulares em todas as disciplinas e áreas disciplinares.
Por tudo isto, podemos afirmar que a única coisa que verdadeiramente mudou foi a queda das máscaras que a ministra usava:
- do rigor e da determinação, ao reconhecer, em menos de quinze dias, que o modelo que era perfeito e estava a ser aplicado normalmente em todas as escolas afinal tinha erros de concepção, que impediam a sua aplicação normal pelas escolas;
· da necessidade deste modelo para melhorar as práticas lectivas, uma vez que só a pedido dos professores as suas práticas serão avaliadas;
- da avaliação rigorosa porque, na prática, o que a ministra anunciou foi algo muito semelhante ao decidido pelo governo regional da Madeira, quando Alberto João Jardim anunciou que já em 2008/2009 todos os professores a trabalhar na região autónoma serão classificados com bom, através de decreto regional assinado pelo seu próprio punho;
No caso do continente, a classificação de bom não terá a assinatura presencial de Maria de Lurdes Rodrigues, apenas porque ela delegou tal tarefa nos PCE, ao mesmo tempo que deixou a porta aberta para que alguns peçam para ser excelentes.
No entanto, a ministra e o governo sabem que esse será um número residual, que apenas servirá a retórica governamental de que a maioria dos professores não quer ser avaliada. É que as condições de acesso a essa classificação são tão difíceis, o filtro das quotas é tão apertado, o esgotamento em que já se encontram avaliadores e avaliados é tão grande e os benefícios práticos por tal classificação são tão exíguos, que o mais natural é que quase ninguém se dê ao trabalho de a requerer.
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