MOÇÃO
COM VISTA À SUSPENSÃO DA APLICAÇÃO DO NOVO MODELO DE AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DOS DOCENTES INSTITUÍDO PELO DECRETO REGULAMENTAR N.º 2/ 2008, DE 10 DE JANEIRO
Ex.ma Sr.ª
Presidente do Conselho Pedagógico do
Agrupamento de Escolas do Arco,
Os Educadores e Professores do Agrupamento de Escolas do Arco, concelho de Cabeceiras de Basto, abaixo assinados, declaram o seu desacordo em relação ao novo modelo de Avaliação do Desempenho Docente, introduzido pelo Decreto Regulamentar n.º 2/2008.
Não põem em causa a Avaliação do Desempenho como instrumento conducente à valorização das suas práticas docentes, com resultados positivos nas aprendizagens dos alunos e promotor do desenvolvimento profissional. Consideram que a Avaliação do Desempenho constitui assunto demasiado sério, que deve resultar de uma ampla e séria discussão, que afaste qualquer desconfiança de um processo arbitrário e punitivo. Michael Fullan e Andy Hargreaves observaram na sua obra Por que é que vale a pena lutar?, editada pelo Porto Editora, em 2001: «A imposição de esquemas punitivos de avaliação a todos é como utilizar uma marreta para esmagar uma noz. Tal imposição reduz a “avaliação” ao mínimo denominador comum. Os esquemas de avaliação que implicam 100% do pessoal docente, tendo em vista detectar uma pequena percentagem de incompetentes, constituem uma perda de tempo considerável. Ironicamente, a ansiedade que provocam também pode desincentivar a excelência de muitos que se tornam relutantes em correr riscos, devido ao receio da punição.»
Ora os mentores de tal modelo de Avaliação parecem não conhecer estudos internacionais sobre o assunto, que lhes permitissem evitar erros cometidos noutras latitudes.
Advogam um modelo de avaliação resultante de um amplo debate nacional entre professores, os seus legítimos representantes e a tutela, a qual envolva os professores e fomente a qualidade e o prestígio da escola pública. O modelo de Avaliação previsto pelo Decreto Regulamentar n.º 2/2008 não assegura a justiça, a imparcialidade e o rigor, nem valoriza, de facto, o desempenho dos docentes.
Por outro lado, questionam: Por que razão terá de ser avaliado um professor próximo do fim da carreira, como se se tratasse de um novato? Será justo assistir às aulas de todos os professores como se os mesmos tivessem a mesma experiência?
Foi tido em conta o nível de stresse dos professores antes da implementação de um sistema como este preconizado pelo Decreto Regulamentar n.º 2/2008? Um estudo divulgado em Março de 2003 pela revista Pais & Filhos sobre o stresse dos professores concluía o seguinte:
“Quanto ao factor «mudança» que surge no topo das causas de stress dos professores, a equipa do IPSSO tem uma posição clara: «Não parecem ser as mudanças pedagógicas ou curriculares do sistema de ensino em Portugal que, em si, constituem situações de stress dos professores questionados, mas antes o ritmo com que são introduzidas, a amplitude que elas ambicionam, a falta de informação que sempre as acompanham e o aparente distanciamento que afasta quem as planeou de quem, na realidade, tem de as implementar». Sendo assim, a ideia não é propriamente acabar com as inovações, mas sim introduzi-las de forma mais pensada e gradual e, sobretudo, acompanhadas por um maior esclarecimento e apoio àqueles que têm de as implementar no terreno: os professores. Propõe-se a avaliação das ideias inovadoras antes de serem generalizadas, o diálogo entre quem planeia a mudança e aqueles que a executam, bem como o apoio adequado em recursos…”
Pelo que temos observado, o nível de stresse tem vindo a aumentar perigosamente, o que poderá vir a reflectir-se negativamente no ensino- -aprendizagem e na relação pedagógica com os alunos.
Os critérios que nortearam o primeiro Concurso de Acesso a Professor Titular geraram uma divisão artificial e gratuita entre “professores titulares” e “professores”, valorizando apenas a ocupação de cargos nos últimos 7 anos, independentemente de qualquer avaliação da sua competência pedagógica, científica ou técnica e a certificação da mesma. Nesta “lotaria ministerial” ficaram de fora muitos professores com currículos altamente qualificados, com anos de trabalho dedicado ao serviço da Educação e com investimento na sua formação pessoal, gerando injustiças nas escolas.
Este modelo de Avaliação tem subjacente uma lógica burocrática, desviando os professores dos reais objectivos que devem presidir ao processo de ensino-aprendizagem. Por outro lado, a sua apressada implementação tem desviado as funções dos professores para tarefas burocráticas de elaboração e reformulação de documentos legais necessários à implementação deste modelo de Avaliação em detrimento das funções pedagógicas. Estes documentos têm sido o resultado de um trabalho puramente técnico por parte dos professores, consistindo quase todos num agregado de propostas às já elaboradas por outras escolas e não um trabalho pedagógico e consistentemente estruturado no Projecto Educativo desta escola. Estaremos, deste modo, a pensar numa escola para todos e de cada um, como preconiza a LBSE e à medida da realidade específica deste Agrupamento, de acordo com o regime de Autonomia, Administração e Gestão das escolas? As escolas são, neste momento, cenário de professores afogados em burocracia, instabilidade e insegurança, situação inconciliável com o verdadeiro propósito da docência. Como pode haver ensino de qualidade e sucesso escolar se os professores investem a maior parte do seu tempo (que no momento ultrapassa largamente as 35 horas semanais) na elaboração e preenchimento de um emaranhado de documentos burocráticos nos quais se ancora este modelo de Avaliação?
Não é legítimo que a Avaliação do Desempenho dos Docentes e a sua progressão na carreira se subordine a parâmetros como o sucesso dos alunos, o abandono escolar e avaliação atribuída aos seus alunos. Desprezam-se variáveis inerentes à realidade social, económica, cultural e familiar dos alunos que escapam ao controlo e responsabilidade do professor e que são fortemente condicionadoras do sucesso educativo. Neste registo, este modelo não discrimina positivamente os docentes que leccionam turmas com situações problemáticas e com maiores dificuldades de aprendizagem. A imputação de responsabilidade individual ao docente pela avaliação dos seus alunos configura uma violação grosseira do previsto na legislação em vigor quanto à decisão da avaliação final do aluno, a qual é da competência do Conselho de Turma sob proposta do(s) professor(es) de cada área curricular disciplinar e não disciplinar.
Por outro lado, por que razão o Ministério da Educação não demonstrou ter acolhido as Recomendações n.º 2/ CCAP/ 2008 do Conselho Científico para a Avaliação dos Professores, dando instruções às escolas acerca das mesmas?
Os docentes deste Agrupamento rejeitam a penalização do uso de direitos constitucionalmente protegidos como sejam a maternidade/ paternidade, doença, participação em eventos de reconhecida relevância social ou académica, cumprimento de obrigações legais e nojo, nos critérios de atribuição da menção de Muito Bom ou de Excelente.
O horário de trabalho dos professores imposto pelo Ministério da Educação é demasiado escasso para responder às inúmeras tarefas e funções que lhes são atribuídas ou solicitadas. Dez ou onze tempos de trabalho individual não são suficientes para a planificação de aulas, a análise das estratégias mais adequadas, a criação de recursos diversificados e inovadores, a elaboração de recursos para os apoios educativos e para os alunos que exigem um ensino diferenciado, a preparação de instrumentos de avaliação diagnóstica, formativa e sumativa, a correcção dos mesmos, a reflexão sobre os resultados, a reformulação de práticas,… Para além destas funções, há ainda a participação nas reuniões dos órgãos de gestão intermédia, sem esquecer a dinamização/participação em actividades extracurriculares e de intervenção na comunidade educativa.
Com que legitimidade impõe o Ministério da Educação aos professores uma avaliação que lhes vai consumir o tempo com reuniões, papéis e relatórios, em prejuízo claro da sua vida pessoal, familiar e, sobretudo, profissional? É um facto que os Professores já começam a queixar-se de falta de tempo para preparar devidamente as actividades lectivas. O Ministério da Educação não pode pôr em prática um sistema avaliativo construído sobre o desrespeito, a anulação da vontade, a exploração dos professores e a ameaça.
O regime de quotas impõe a manipulação dos resultados da avaliação, gerando nas escolas situações de profunda injustiça e parcialidade, devido aos “acertos” impostos pela existência de percentagens máximas para atribuição das menções qualitativas de Excelente e de Muito Bom, estipuladas pelo Despacho n.º 20131/2008, e que reflectem claramente o objectivo economicista subjacente a este modelo de Avaliação.
Enquanto as limitações, arbitrariedades, incoerências e injustiças que enformam este modelo de Avaliação não forem corrigidas, os professores signatários desta moção, por não lhe reconhecerem qualquer efeito positivo sobre a qualidade da Educação e do seu desempenho profissional, solicitam ao Conselho Pedagógico a suspensão de toda e qualquer iniciativa relacionada com a avaliação por ele preconizada.
Agrupamento de Escolas do Arco, 3 de Novembro de 2008
Os Professores signatários,
O documento foi analisado no respectivo Conselho Pedagógico, tendo os elementos daquele órgão decidido remeter o pedido à Ministra da Educação, com os fundamentos que se seguem no documento a seguir indicado.
Os Coordenadores dos diversos Departamentos sublinham que têm vindo a cumprir a sua função, no sentido de ser realizada a avaliação dos docentes do respectivo Departamento, conforme o Decreto Regulamentar n.º 2/ 2008, de 10 de Janeiro. No entanto, não podem ignorar o documento apresentado pelos docentes deste Agrupamento, o qual foi assinado por um número elevado de Professores, pois reconhecem justeza nas observações feitas no mesmo.
Por outro lado, reconhecem aos docentes «o direito a emitir opiniões e recomendações sobre as orientações e o funcionamento do estabelecimento de ensino e do sistema educativo», conforme estipula a alínea a do ponto 2 do Artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de Janeiro.
Os Coordenadores de Departamento gostariam também de ver aceites pelo Ministério da Educação as Recomendações n.º 2/CCAP/2008 do Conselho Científico para a Avaliação de Professores, uma entidade criada por si, com as seguintes Atribuições, segundo a Artigo 3.º do Decreto Regulamentar n.º 4/2008:
«No âmbito da sua função consultiva, o CCAP formula recomendações, orientações, pareceres e propostas que, tendo por referência o conhecimento consolidado e a informação actualizada na área da sua intervenção, contribuam para:
a) Fundamentar decisões e procedimentos em matéria de avaliação de desempenho do pessoal docente;
b) Promover a adequada aplicação e utilização do sistema de avaliação de desempenho do pessoal docente;
c) Fomentar uma cultura de avaliação docente e de desenvolvimento profissional.»
Ora não vimos até agora sinais de que o Ministério da Educação tenha dado acolhimento às recomendações formuladas pelo CCAP nem de que o pretenda fazer.
Tendo em conta o que atrás foi dito, os membros do Conselho Pedagógico do Agrupamento de Escolas do Arco concluem que o melhor é solicitar ao Ministério da Educação a suspensão do processo de Avaliação do Desempenho dos Docentes, até que o mesmo decida rever o Decreto Regulamentar n.º 2/ 2008, expurgando-o daqueles aspectos que os professores consideram ser negativos e que não fomentam uma sã convivência entre pares, nem contribuem para a melhoria do sucesso educativo dos alunos, assim como acolher as recomendações efectuadas pelo Conselho Científico para a Avaliação dos Professores.
Arco de Baúlhe, 6 de Novembro de 2008
Os membros do Conselho Pedagógico
do Agrupamento de Escolas do Arco,
Um comentário:
Vale a pena ler a petição dos Pais em http://www.petitiononline.com/minedupt/petition.html
Subscrever e divulgar.
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