sábado, 19 de setembro de 2009

OPINIÃO > Daniel Proença de Carvalho: «Voto útil»

O aspecto que mais me tem surpreendido nesta campanha para as legislativas é a aparente descontracção com que os líderes dos principais partidos vêem a questão da governabilidade do país na segunda-feira seguinte ao dia eleitoral.

A dr.a Manuela Ferreira Leite vai ao ponto de desvalorizar a relação entre governabilidade do país e Governo com maioria parlamentar.

Compreende-se perfeitamente que o BE, o PCP e o CDS lutem afincadamente contra qualquer maioria absoluta; como é evidente e natural, o CDS sonha em ser indispensável a um Governo liderado pelo PSD ou mesmo pelo PS. O BE quer ir aumentando o seu espaço de influência; se o PS ganhar sem maioria, o tom de voz de Francisco Louça, já de si bastante elevado, ganhará maior fôlego; se for o PSD, tentará mesmo liderar o descontentamento da esquerda, perante um Governo frágil.

O simples senso comum mostra que um Governo sem maioria é um Governo muito fraco, sem nenhumas condições para levar a cabo as reformas de que o país precisa.

Os eleitores, revelando bom senso, usaram o voto útil para darem maiorias a Sá Carneiro, Cavaco Silva e José Sócrates e, em coligação previsível, a Durão Barroso. Portugal estaria hoje muito pior se Cavaco Silva não pudesse ter levado a cabo as reformas de liberalização da economia no período longo em que governou, ou se José Sócrates não tivesse conseguido, antes da actual crise mundial, diminuir o défice das contas públicas, introduzir reformas importantes na Segurança Social e na Administração Pública e agir com rapidez nas medidas anti-crise no sector financeiro e no apoio às empresas e aos desempregados. Será que sem maioria parlamentar, quer Cavaco Silva, quer José Sócrates, teriam tido apoio para essas reformas?

No estado actual da composição partidária, só haverá duas alternativas viáveis e coerentes de estabilidade política: ou um Governo de maioria PS ou um Governo PSD/CDS. Os eleitores sem vinculação partidária, na hora de decidir, vão certamente equacionar a utilidade do seu voto. Quem desejar estabilidade não tem outras escolhas, quem preferir um voto de protesto tem muitas outras.

Neste cenário, esperava que os líderes dos dois principais partidos dramatizassem ― neste caso com verdade ― a necessidade de o país ter um Governo com a força suficiente para enfrentar as dificuldades que já estamos a viver e que não vão atenuar-se no futuro. A ambição de ganhar só é legítima se for para bem do país, não o será se for apenas para atingir uma vitória pírrica, que dará lugares no Governo, na Administração e nas empresas públicas, mas que não serve os portugueses.

Daniel Proença de Carvalho, Advogado

Fonte: Económico

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