Há dias, em Torres Novas, Ana Maria Magalhães foi almoçar com professores de uma escola onde tinha ido falar dos livros que escreve com Isabel Alçada. Numa mesa próxima estavam sentados docentes de outro estabelecimento de ensino. Um deles não perdeu a oportunidade: “Diga à sua amiga que acabe depressa com os professores titulares, porque eu dou aulas há 30 anos e sempre tive amigos, mas desde que sou titular só tenho inimigos.”
Convidadas por outros professores, as duas autoras tornaram-se uma presença habitual nas escolas. Por causa dos seus livros da série juvenil Uma Aventura e também, desde 2006, no caso de Isabel Alçada, por ser, a convite de Maria de Lurdes Rodrigues, a comissária do Plano Nacional de Leitura (PNL), criado para reconciliar crianças e jovens com a palavra escrita.
Nos últimos anos, ambas foram testemunhas das feridas abertas nas escolas por algumas das medidas aplicadas pela anterior ministra. Como aquela de que se queixava o professor de Torres Novas. Pela primeira vez, a carreira docente foi dividida em duas categorias hierárquicas e no acesso àquela que é superior, a dos titulares, privilegiou-se o exercício de cargos, em detrimento da qualidade na sala de aula.
Aposentada há poucos anos, Ana Maria Magalhães respira de alívio: “Não tive de aturar o que se passou.” Só que agora a sua amiga Isabel Alçada é ministra da Educação. É a primeira vez que este cargo é ocupado por uma professora do ensino básico, mais precisamente do 2.º ciclo. Foi um deles e esta é uma condição que os professores não vão deixar esquecer.
Ana Maria Magalhães assegura que transmitiu o recado de Torres Novas “exactamente” como lhe foi dito. Não foi o primeiro, nem terá sido o último. Diz que “não é possível fazer nada com os agentes de ensino revoltados”. Está disponível: sempre que receber um recado das escolas por onde andar, há-de fazê-lo chegar à ministra. “E ela quererá ouvi-lo”, tem a certeza.
Quando a nova ministra tomou posse, fez ontem um mês, o conselho científico da Escola Superior de Educação (ESE) de Lisboa, que forma docentes do básico e onde Isabel Alçada trabalhou desde 1986 ― depois de ter leccionado na então preparatória Fernando Pessoa e de concluir um mestrado em Boston, EUA ― votou, por unanimidade, uma mensagem de congratulação, onde se pedia: “Escute a voz dos professores.”
Na semana passada, o Ministério da Educação (ME) deu como morto o actual modelo de avaliação dos professores. Anteontem confirmou que quer acabar com a divisão da carreira docente, embora tenha proposto novas limitações à progressão na profissão, o que deixa antever novas fricções e provocou já críticas mesmo entre aqueles que não poupam elogios à ministra, como é o caso de Ramiro Marques, autor do blogue Profavaliação. “Mais do mesmo, sob outro estilo?” Ele espera que não.
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