Numa conferência proferida no tempo da Reforma Educativa (1989), Pedro d’Orey da Cunha, naquele tempo Secretário de Estado do Ministro Roberto Carneiro, insistia ― e bem ― que o meio para fazer a reforma passava por uma relação pedagógica baseada na autonomia. E enunciava dez princípios para caracterizar essa relação. Neste (novo) tempo de pós-reforma é bom evocar a sabedoria desses princípios.
1. O princípio da fascinação.
O bom professor é o que faz com que os alunos gostem da matéria a estudar, é o que expressa, de vários modos, entusiasmo por aquilo que faz, é o que manifesta o fascínio pelos saberes que transmite e constrói.
Ainda neste início de ano lectivo, à pergunta ― o que é para ti um bom
professor ― um aluno do 10.° ano escrevia: é o que faz com que gostemos da matéria.
2. O princípio da expectativa.
“É claro que não basta apresentar bem a matéria para que ela atraia e o aluno se ponha a caminho”. É preciso confiar e transmitir confiança nas possibilidades de aprendizagem: “Se eu estou convencido que o aluno pode, ele poderá; se eu espero que ele aprenda, ele aprenderá; se eu confio em que ele estude, ele estudará”. Não teremos aqui a verdade universal, mas é, sem dúvida, um grande princípio que deveria estar afixado em todas as salas de professores e ser exaustivamente discutido em todas as reuniões do Conselho Pedagógico.
3. O princípio do respeito
“A expectativa não pode ser indiscriminada e automática. Aquilo que eu espero dos meus alunos tem de ser pautado pelo respeito das suas características, pelo seu estádio de desenvolvimento,pelos seus interesses emergentes”. Evidentemente. Porque se o não fosse seria uma ilusão e um defraudamento.
4. O princípio do encorajamento
“A criança pode estar fascinada pela matéria de ensino, pode sentir o calor da relação com o professor, mas o caminho é sempre difícil; há muitas vezes obstáculos a vencer e depressões a ultrapassar”. São assim necessários o olhar que cuida e exige, a mão no ombro que securiza, a palmada nas costas que estimula.
5. O princípio da compreensão
“Diante de um conflito, um problema disciplinar ou uma perturbação, é essencial que o professor se pergunte a si mesmo, antes de mais, de quem é o problema, ou melhor, quem sofre com o problema. Assim, se quem está a sofrer é a criança, esta precisa de compreensão, não de ralhete. Mas se quem sofre é o professor, ou outros alunos, então a criança não precisa de compreensão, necessita de confrontação.”. Esta é outra chave essencial que tem de ser sistematicamente convocada.
6. O princípio da confrontação
“Fazer ver aos alunos os efeitos nefastos das suas acções e desafiá-los a agir de outro modo sem os humilhar”. Aqui também reside o princípio da autoridade, o de fazer crescer o outro em autonomia e responsabilidade.
7. O princípio das consequências
“São as consequências das nossas acções que nos vão dirigindo, ensinando-nos a caminhar por uma direcção e evitar outra. Assim, se a criança se levanta tarde e perde o autocarro, não a castiguem nem a absolvam nem muito menos esperem por ela: deixem-na ir a pé; há-de aprender que quem não se levanta a tempo tem de ir à sua custa. Se perdeu um livro, não lhe dêem a bofetada nem lhe comprem outro: obriguem-na a pagar do seu bolso”.
8. O princípio da negociação criativa
“A arte de educar na autonomia consiste no contínuo esforço para promover não soluções de compromisso em que todos perdem um pouco mas alternativas de superação em todos ganham tudo”.
9. O princípio do diálogo
“Nem todas as necessidades resultam em conflitos, nem todas as opiniões têm de provocar desavenças, nem todos os sentimentos chocam ou desiludem os outros. Pelo contrário, a partilha de ideias, opiniões e sentimentos é o processo normal de aprofundar a amizade, construir a intimidade e desenvolver esse ingrediente essencial da autonomia que é estar-se contente consigo próprio e com a sua maneira de ser”.
10. O princípio da exigência
“O bom professor não aceita trabalhos mal feitos, respostas mal articuladas, projectos sem gosto nem cuidado”. Exige o máximo de cada um dos alunos para que nenhum trabalhe abaixo das suas capacidades.
(Sequências desenvolvidas a partir de Pedro Cunha (1989). A Relação Pedagógica. Lisboa: Ministério da Educação)
→ Com a devida vénia ao José Matias Alves
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