Depois de cinco décadas debruçado sobre a aplicação da análise econômica aos diversos campos da vida, o senhor depreendeu padrões no comportamento humano? Ao contrário do que se pode supor à primeira vista, a racionalidade exerce um papel crucial na hora de as pessoas tomarem grandes decisões, o que interfere na lógica da própria economia. É curioso notar que isso ocorre mesmo quando as questões são de fundo profundamente emocional, como o casamento, pois esse é um processo decisório em que claramente se levam em consideração aspectos econômicos, como a situação financeira do futuro cônjuge e a perspectiva de o casal prosperar junto em um longo prazo. Tais considerações ajudam a explicar a grande incidência de uniões entre indivíduos de renda e nível de escolaridade semelhantes, especialmente nas classes mais altas. Meus primeiros estudos já demonstravam que também o número de filhos em uma família é determinado por um cálculo em que a razão prevalece.
Que cálculo é esse? Os casais consideram a disponibilidade de tempo que terão para criar os filhos e quanto realmente desejam investir na educação da prole. Nessa lógica, os mais bem-sucedidos na carreira tendem a registrar taxas de fecundidade mais baixas, pois, além de alimentarem grandes expectativas quanto à formação das crianças, seu tempo custa mais. É por isso que o ingresso e a prosperidade das mulheres no mercado de trabalho têm contribuído decisivamente para a queda dos indicadores de fertilidade. Sobretudo em países mais ricos, onde os custos de uma creche ou de babás são elevados, ter filhos significa deixar a carreira em segundo plano ou mesmo abandoná-la por um tempo.
As mulheres tendem a se tomar economicamente mais poderosas que os homens? Uma análise apressada poderia nos levar a concluir que essa é, sim, uma tendência inevitável, já que o nível educacional das mulheres aumenta muito no mundo todo. Só que elas precisam lidar com duas desvantagens. A primeira diz respeito à maternidade, que as afasta, pelo menos momentaneamente, do mercado. A segunda é o fato de a diferença de renda em relação aos homens ainda ser grande. São dados que indicam que a batalha feminina ainda está longe de ser vencida.
[Extracto da entrevista a Gary Becker, publicada pela revista brasileira Veja (3 de Agosto de 2011]
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