quarta-feira, 29 de outubro de 2008

OPINIÃO > José Couto: «A avaliação de professores»

Relativamente à secção "Sobe e desce" de sexta-feira, 24 de Outubro, e porque é seu dever não manipular a opinião pública, considero importante esclarecê-lo do seguinte:
Repetindo aquilo que já foi dito por inúmeros colegas meus, e ao contrário do que é referido por V. Ex.a, a maioria dos professores aceita e quer ser avaliada. Aliás, a avaliação da classe não é uma novidade, sempre se realizou: sempre foi necessário frequentar e concluir com sucesso acções de formação contínua (gratuitas e pagas), com um mínimo de 25 horas por ano (em horário extralectivo – noites e fins-de-semana) e de elaborar um relatório crítico de desempenho (anual para os contratados e plurianual para os docentes dos quadros). O que a maioria dos professores não aceita é este modelo de avaliação que foi imposto pela tutela sem qualquer negociação prévia e que tem na sua génese uma unívoca razão: economizar! Sim, leu bem, economizar! Sabe como?
Começou com o congelamento das progressões de todos os docentes durante quase três anos – três –, em que não houve aumentos salariais e se reduziram direitos na saúde (diminuição das comparticipações na ADSE). Continuou com a divisão arbitrária da carreira em "professores titulares" e "professores", travando a progressão da maioria dos docentes.
Prosseguiu depois com o desrespeito ofensivo pela classe e com a facilitação da aposentação dos professores com mais idade e anos de serviço – os que tinham uma menor componente lectiva e uma maior remuneração –, levando, como se tem visto nos últimos meses, à debandada geral, o que, em muitos casos, representa "deitar fora o bebé com a água do banho"...
Continua, agora, com este modelo de avaliação orientado para a formatação uniformizadora da actividade docente, para a perseguição da diferença, para a punição e para o controlo burocratizado; que é incapaz de avaliar a qualidade das pessoas; que premeia o "fogo-de-artifício" e não o mérito; que culpa e penaliza os professores por um abandono escolar de que não é responsável; que penaliza os professores que leccionam disciplinas sujeitas a exame nacional; que vai produzir resultados enganadores e um sucesso fictício; que "afoga" os professores em papeladas e lhes retira tempo para o essencial – a preparação das aulas e o trabalho com os alunos; e que, com as suas cotas, vai manter a maioria dos professores a "marcar passo" no escalão – e no índice remunerativo!
Mas não pense que só faço críticas e não apresento soluções. Ora, se a preocupação deste ministério e deste Governo é a melhoria da educação e o sucesso efectivo dos alunos, então:
1.º Que se reveja o ECD e se acabe com a divisão arbitrária, injusta e inútil da carreira docente, reinstalando a carreira única e motivando, assim, os professores para o cumprimento das metas.
2.º Que se aplique um modelo de avaliação que seja formativo, responsabilizador da comunidade educativa no seu conjunto e efectivamente valorizador do trabalho realizado pelos professores.
3.º Que melhorem as condições de trabalho nas escolas (a prioridade não é, de certeza, o Magalhães...).
4.º Que se pare de "inundar" as escolas com leis, decretos-lei, decretos regulamentares, despachos normativos, portarias, ofícios, circulares, de modo sistemático, não dando tempo para a sua assimilação.
5.º Que se retomem as medidas que permitiam a efectiva integração e o apoio individualizado e especializado aos alunos com Necessidades Educativas Especiais, e que constavam do DL 319/91.
6.º Que se coloquem psicólogos educacionais e docentes formados em apoios educativos em todas as escolas.
7.º Que se altere o Estatuto do aluno, que permite que ele se "balde" às aulas e que, com planos de recuperação atrás de planos de recuperação, venha a progredir "na maior".
8.º Que se reduzam as turmas de 28 alunos para um máximo de 24 e que haja um desdobramento, não só nas ciências, mas também, e sobretudo, no Português – "pedra basilar" de todo o ensino.
Outras medidas poderiam ser tomadas, estou de acordo, mas estas, a meu ver, já seriam suficientes para conseguir cumprir os objectivos supracitados.
Diversos agentes da nossa comunicação social são, infelizmente, costumeiros nestes três pontos: 1. não estão bem informados e, por isso, opinam e informam mal; 2. não são isentos e imparciais; e 3. pura e simplesmente, não pensam, ou não querem pensar. Mas, enfim, entende-se, pois, como já dizia Henry Ford, "pensar é o trabalho mais pesado que há e talvez seja essa a razão de tão poucas pessoas se dedicarem a tal tarefa".


José Couto, professor,
Tavira

FONTE: PÚBLICO 29.10.2008
Secção "Cartas ao Director"

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