Uma amiga, professora, viu-se recentemente “colocada” num curso das “Novas Oportunidades”. À chegada, a novinha e bem-intencionada docente inquiriu os colegas sobre os temas e manuais a leccionar. A galhofa que se seguiu durou meia hora: a pobre ignorava que as “Novas Oportunidades” não visam leccionar coisa alguma, mas fornecer habilitações literárias a iletrados e impressionar os rankings internacionais.
Nisso, a iniciativa é um sucesso. O Sol relatou o caso de uma senhora que, após “saltar” seis anos de escolaridade em ano e pouco, frequenta agora uma licenciatura. Se Portugal prosseguir a adaptação caseira de Bolonha, é possível que a senhora acabe a licenciatura, eventualmente de medicina, em seis meses.
Por enquanto, as facilidades ficam-se, algo injustamente, pelo 9.º e 12.º anos, e mesmo o termo depende da perspectiva. O presidente da Agência Nacional para a Qualificação chama à facilidade “dinâmica” e, o que é notável, acha a “dinâmica” insuficiente. Na opinião do sr. Luís Capucha, divulgada anteontem, urge multiplicar por sete os quatro mil adultos “certificados” mensalmente. Isto significa que, apesar de tudo, a exigência do programa tem sido excessiva. Pelos vistos, não basta que os alunos terminem a “formação” com os conhecimentos (digamos) que possuíam quando a começaram: é preciso que saiam a saber ainda menos. Nas contas do sr. Capucha, sete vezes menos.
Perante tal objectivo, percebe-se que o próprio eng. Sócrates classifique cada inscrição nas “Novas Oportunidades” como “um acto de coragem”. Não se percebe tão bem que julgue os respectivos “certificados” como cidadãos aptos a “melhor servir a família, a empresa e o País”. Parece-me mais provável o contrário: dado o radical analfabetismo que as “Oportunidades” garantem, suspeito que, se não forem as famílias, as empresas e o País a cuidarem dos “certificados”, estes estarão condenados à indigência. Ou, na pior das hipóteses, a um cargo de nomea- ção política.
Alberto Gonçalves, Sociólogo
in revista SÁBADO N.º 240 | 4 de Dezembro de 2008
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