sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Se chegassem os discursos para mudar a situação...

Ultimamente, tem-se instalado em alguns setores da sociedade portuguesa a ideia de que a qualificação e a formação escolar de pouco ou nada servem para alcançar sucesso profissional. Reconhecendo embora que existem, de facto, muitos jovens qualificados que enfrentam o flagelo do desemprego, a questão que se coloca é a de saber se, caso não tivessem qualificações, teriam mais êxito profissional ou melhor acesso ao mercado de trabalho. A resposta é claramente negativa.
Nesta fase da vida nacional, é natural que muitos jovens, desiludidos por falta de oportunidades de mostrarem o que valem, decidam partir para outros destinos, em busca do justo reconhecimento do seu mérito.

Uma geração que não tenha futuro no seu país mais dificilmente poderá ajudar a cuidar dos seus pais, mais dificilmente poderá ajudar a inverter a quebra da taxa da natalidade.
A baixa natalidade, e as suas consequências demográficas, sociais e económicas são talvez o maior desafio que Portugal enfrenta no longo prazo, para o qual devo alertar os Portugueses.

Nesta fase, devemos adiar obras vultuosas e grandes realizações. Mas não podemos hipotecar o futuro, comprometendo o investimento na educação das nossas crianças e jovens. Esse investimento terá de ser seletivo, racional, financeiramente rigoroso, orientado por prioridades, concretizado através de uma política coerente que os Portugueses conheçam.
Temos grandes desafios pela frente. Alguns que infelizmente permanecem, como é o caso do combate ao abandono escolar. Segundo os dados publicados no último relatório anual da OCDE sobre Educação, apenas 52 por cento da população portuguesa entre os 25 e os 34 anos concluiu o Ensino Secundário, o que coloca o nosso país no 33º lugar em 36 países.
A extensão da escolaridade obrigatória até ao 12.º ano exigirá, assim, um esforço suplementar por parte dos alunos e das suas famílias, bem como uma adaptação das escolas e dos seus professores.
O desafio da qualidade do ensino renova-se à medida que o número de anos de escolaridade se alarga. Um ensino de qualidade, acessível a todos, é a melhor garantia da igualdade de oportunidades, a chave de um país justo. Ninguém pode ficar para trás.
A Educação continua a ser o melhor investimento que cada um pode fazer no seu futuro, o que é comprovado pelos mais diversos estudos internacionais.
Há que valorizar os aspetos imateriais da Educação. As famílias, as crianças e os jovens têm de perceber que vale sempre a pena estudar, trabalhar com esforço e dedicação, buscar a excelência. Não podemos permitir que se instale a ideia de que o sucesso se alcança por outros meios, de que não valerá a pena estudar, uma vez que as qualificações académicas não são garantia de um melhor futuro profissional.

Assim, todos somos chamados a refletir sobre a escola que queremos. Uma reflexão sobre os modelos de ensino, as competências e os conhecimentos que melhor respondem aos complexos desafios do mundo de hoje e melhor preparam os jovens para os enfrentar. Em suma, como pode a escola contribuir para uma maior empregabilidade dos nossos jovens e para que a educação seja um impulsionador da competitividade e da criação de riqueza no nosso país.
A verdade é que temos de trabalhar mais e melhor na ligação entre o ensino e a vida profissional, na correspondência dos conhecimentos e das competências adquiridas às necessidades da economia e das empresas, sujeitas a uma crescente competição a nível internacional.
Uma maior articulação entre as escolas e as empresas, ao longo dos diversos níveis de ensino, é um caminho que deve ser aprofundado.
Os alunos devem ser preparados ao longo do seu percurso escolar para um ambiente de maior exigência. Mas é essencial que se sedimente entre os alunos uma cultura de liberdade e de responsabilidade. Os jovens devem ter consciência de que ninguém os poderá substituir nos seus deveres e nas suas legítimas aspirações de realização pessoal.
Por sua vez, o papel dos professores tem de ser valorizado e dignificado. O reconhecimento da ação fulcral dos professores não assenta apenas em fatores materiais. Pressupõe, isso sim, a valorização da escola, em articulação com as famílias e as autarquias, como agente privilegiado de construção do futuro. A escola deve ser vista como um espaço de exigência e de oportunidades. Se ambicionamos um futuro melhor, temos de ambicionar ser melhores no futuro.
Para alcançarmos esse objetivo, insisto, o papel dos professores deve ser reconhecido e apoiado. Neste dia 5 de outubro, aniversário de uma República que se distinguiu pela sua matriz pedagógica, quero expressar o meu público reconhecimento aos professores que se dedicam e empenham na sua atividade de construtores do futuro. A todos eles, muito obrigado. Em nome do Portugal de hoje, mas também em nome do Portugal de amanhã.
É certo que várias transformações estruturais da sociedade portuguesa, com destaque para a baixa da natalidade, se irão refletir na dimensão do corpo docente. Trata-se de uma questão quantitativa, que, todavia, não retira importância aos aspetos qualitativos, à necessidade imperiosa de uma aposta consistente na qualidade do ensino.
Sei bem que tempos difíceis são tempos de contenção. Com menos, temos de fazer mais. Mais e melhor.
As funções dos professores ultrapassam em muito a estrita atividade letiva. A rede de professores, disseminada pelo País, permite detetar situações de carência, assinalar casos que necessitam da intervenção e do apoio do Estado.
Os professores têm também um papel fulcral na articulação com a sociedade civil, especialmente com as famílias. O futuro da Educação depende da participação da comunidade na vida da escola e de uma articulação profunda entre família, professores e alunos. Em tempos de crise, essa articulação tem de ser mais forte. Em tempos de crise, são estes laços, os laços mais próximos, mais presentes e mais importantes nas nossas vidas, que devem começar por unir os portugueses.
Por vezes, esquecemos que muitos dos países mais desenvolvidos o são porque as suas comunidades integraram, desde há longos anos, práticas sociais constantes de valorização da Educação e que é isso que sustenta no tempo o seu desenvolvimento.
Num tempo dominado pela pressão do imediato e pelo medo da privação de muitos dos bens materiais a que nos habituámos, não podemos esquecer o valor da educação. Temos, aliás, o imperativo republicano de o lembrar e de o colocar bem alto nas prioridades, não apenas dos responsáveis políticos, mas de Portugal inteiro.
   Extractos do discurso solene do Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva
nas Comemorações do 5 de Outubro,
Dia da Implantação da República

Um comentário:

Anônimo disse...

Os portugueses têm menos crianças porque o seu futuro não é promissor. Quando não há rendimento suficiente para criar uma família, pagar uma casa ou a renda de uma, saúde e outras despesas, quem se aventura a ter dois ou três filhos? Muitos jovens estão é a emigrar e vão ter filhos noutro lado que julgam mais acolhedor.
Embora seja louvável que a população portuguesa se renove se renove sem necessidade de imigrantes, isso não é um drama e há até muitos países em que essa realidade existe à muitos anos: Luxemburgo, por exemplo. Os imigrantes não custaram dinheiro ao país, vêm prontos a trabalhar e também fazem meninos (ajudam à natalidade). Há muitos pelo mundo inteiro quem não se importe de vir pra cá embora este país esteja cada vez pior e parece precisar mais de escravos do que trabalhadores, por isso muitos dos imigrantes que recebemos não há muitos anos já partiram ou estão "de malas feitas". Pelo menos, daqui a dez anos não necessitarmos de tantos professores e isso também representa menos despesas do Estado, por isso também há o lado positivo do problema.

Zé da Burra o Alentejano