‘Redução de professores é inevitável
nos próximos anos’
Na última semana, mais de cinco mil professores ficaram sem colocação.
Houve quem falasse do maior despedimento colectivo da História. É uma
consequência desse esforço de contenção?
O Ministério da Educação e
Ciência (MEC) tem mais de 50% do total de funcionários da administração central.
É um Ministério gigantesco e tudo o que se faça nele significa números muito
grandes. Agora, é verdade que houve muitos candidatos a professores que não
ficaram colocados. Muitos deles já tinham dado aulas em momentos anteriores.
Mas não se pode daí concluir que havia aquele número de professores…
Mas há uma redução dos contratados em relação ao ano anterior.
Este ano o sistema absorveu
menos. Até ao momento. Mas nada que se pareça com aqueles números fantasiosos de que se falava, as dezenas de milhares. Chegou-se a uma etapa decisiva, mas ainda há uma série de
colocações...
Há 1.714 horários por
preencher.
Sim. E ainda as
contratações das escolas para as necessidades transitórias que existam. Agora,
se me está a perguntar se o que se está a passar é algo de inevitável, infelizmente é. Infelizmente
porque é uma situação humanamente preocupante. Eu sou professor, sou de uma
família de professores, todos percebemos os problemas humanos de muita gente.
Qual é a explicação para o que se está a passar? A revisão curricular?
O aumento do número de alunos por turma?
O que se está a passar é o
resultado de várias coisas que são mais fortes do que nós. A primeira delas é a
redução da população escolar, em cerca de 200 mil alunos nos últimos anos
(cerca de 14%). É uma diminuição brutal. O que temos sempre dito é que os
professores do quadro são necessários e que além disso há algumas necessidades
mais, mas nós faremos apenas as contratações estritamente necessárias. Nem o
contribuinte português poderia entender uma coisa diferente.
Muitos docentes estão a contrato há 10, 15, 20 anos, muitas vezes com
horários completos. E há o compromisso de vincular esses professores. Esse
compromisso será mantido? E
com que critérios?
O sistema está a evoluir e
nós não queríamos iniciar estudo nenhum sobre isso antes deste início de ano
lectivo. Vamos agora fazer uma reavaliação do sistema onde se detectem casos de
professores que correspondem a necessidades
efectivas do sistema e não a necessidades transitórias, trabalharemos para uma
vinculação extraordinária.”
Há alguma esperança de que as coisas possam mudar para quem não foi
agora contratado?
Há sempre esperanças, mas
no futuro imediato vamos continuar a assistir a necessidades muito limitadas de
contratação.
Está a pensar nesta legislatura?
Estou a pensar nesta
legislatura e na próxima. A natalidade diminuiu, o número de estudantes diminuiu,
daqui a quatro anos vai diminuir ainda mais. E nós temos um sistema que em
muitos aspectos é muito pouco eficiente. É interessante olhar para as
comparações internacionais, por exemplo para o rácio de número alunos por
professor. Nós estamos ao nível dos países ricos, estamos mais do que ricos em
relação a muitos países. Temos menos alunos por professor do que a Áustria.
As adaptações que fez a esse nível têm sido muito criticadas por
professores, que dizem ter 30 alunos por turma, tendo alunos com necessidades
educativas especiais. O que lhes responde?
O que nós fizemos foi
apenas mexer no número máximo de alunos por turma, dos 28 para os 30. Em termos
de países comparáveis ao nosso é um número perfeitamente normal. Espanha
aumentou para 36. E fixar o máximo para 30 não quer dizer que a média fique em 30.
Nós tínhamos a média em 20, 21. Finalmente, quando há turmas com alunos com
necessidades educativas especiais, o número baixa automaticamente.
O que responde a quem vê motivos economicistas nas suas políticas?
A nossa política é uma
política para o essencial. O que é essencial é o conhecimento e nós estamos a trabalhar
em várias frentes nesse sentido. Independentemente da crise orçamental.
Primeiro aspecto: nós percebemos que há uma série de dificuldades básicas no
Português e na Matemática. Em vez de nos dispersarmos mais – nós éramos até há
pouco tempo os campeões da dispersão curricular –, chegámos à conclusão de que
era necessário concentrar a aprendizagem nestas disciplinas fundamentais.
Depois verificámos também que era necessário acompanhar o sistema e introduzimos
progressivamente mais avaliações externas. Este ano, tivemos o 6.º ano, correu
bem. Agora vamos introduzir no 4.º ano de escolaridade. Estamos a introduzir
medidas para reforçar o conhecimento.
Não é por o país estar mais pobre que a Educação empobrece?
Isto não tem que ver com o
país estar mais pobre, tem que ver com a necessidade de melhorar a Educação.
Durante muitos anos pensámos que resolver os problemas na Educação era pôr mais
recursos no sistema, dar mais dinheiro, dar mais professores, dar melhores
salas de aula. Também é dar mais recursos, com critérios. Mas, sobretudo, é dar
objectivos mais claros. Temos de rever e dar mais ambição a currículos que
existem.
Isso quer dizer o quê?
Ter objectivos
curriculares mais exigentes. Os alunos têm de saber mais. Não é por simplificar
as coisas que os resultados melhoram ou os alunos se motivam. Temos verificado
que simplificação atrás de simplificação, cedência atrás de cedência, não traz
objectivos ambiciosos e nós temos de os ter. Estamos, portanto, a trabalhar no
que se refere às metas curriculares, que concretizam ano a ano as matérias que
achamos que os alunos devem saber: Isto é fundamental para os professores,
pais, alunos e também para os avaliadores. E até para quem faz os manuais
escolares.
Estava a falar-nos do 4.º ano e das avaliações externas. Houve quase
uma caricatura do regresso ao velhinho exame da 4.ª classe, à ideia de que os
maus alunos podem ser encaminhados para um sistema profissional...
Ou seja, complexos
intelectuais de politicamente correcto.
A ideia de que vamos voltar a uma escola de discriminação social.
Mas deixe-me começar pelo
4.º ano. O que a psicopedagogia moderna defende e o que os países pelo mundo
começam, pouco a pouco, a perceber é que a avaliação externa é fundamental para
dar incentivos aos alunos e exigência a todo o sistema. O que estamos a fazer
no 4.º ano é paradigmático e é algo que queremos estender depois ao 6.º ano.
Vamos fazer a prova final a Português e Matemática no princípio do terceiro
período. Antes disso, os professores devem ter indicado quais são os alunos que
podem ter dificuldades em completar de forma bem sucedida o 4.º ano, que vão começar
a ter logo apoio especial. Mas é natural que alguma percentagem dos alunos não
consiga ter sucesso nas provas nacionais. O que vamos fazer é dar mais tempo de
escola para que esses alunos possam rever as matérias, concentrar-se nos
aspectos essenciais e possa ser feita, no fim disso, uma reavaliação do estado
em que esses alunos estão.
E como?
Através de uma outra
prova.
E esse modelo será estendido ao sexto ano?
Sim, não já neste ano
lectivo, mas no próximo.
Extractos
da entrevista de David Dinis e Margarida Davim
ao Ministro da Educação e Ciência, Nuno
Crato,
publicada
pelo semanário SOL
(N.º 314, de 7 de Setembro de 2012)
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