segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Educação e democracia

1 – Os postulados da educação não podem ser anti-educativos

Toda a educação supõe princípios norteadores, postulados, os quais assentam na concepção que se tem do indivíduo e da sociedade e das relações entre eles.

Há quem pareça não se dar conta disso, falando como se a educação envolvesse apenas problemas técnicos. Esses, ou por ignorância, ou por interesse, limitam-se a aplicar, como se fossem óbvios ou indiscutíveis, os postulados que outros impuseram.

Há, por outro lado, quem pense que os postulados da educação são superiores a ela, estão fora da competência do educador, competindo ao teólogo ou ao político defini-los e ao educador apenas aplicá-los.

Esta subordinação da educação à teologia ou à «política» nunca se apoiou em razão alguma. É o produto do arbítrio. Ao educador importa considerar a educação do ponto de vista educativo, e não de qualquer ponto de vista metafísico.

Ora, nem todos os postulados são igualmente válidos do ponto de vista educativo. Basta pensar que já houve quem sustentasse as vantagens de não haver escolas ou a de reduzir o tempo de escolaridade. Tal doutrina é, claro está, uma doutrina anti-educativa. E em várias épocas da história se têm aplicado métodos e programas que conduzem a destruir no educando a curiosidade intelectual, o espírito crítico, o gosto da iniciativa e da realização pessoal: é óbvio que esses métodos não promovem a educação, antes fomentam a deseducação. O educador que os aceitasse negaria a sua própria função. É no terreno da educação que o educador tem de ajuizar do valor dos postulados da educação, e não no terreno teológico, político ou qualquer outro. Para ele todo o postulado que se revele destrutivo no campo educativo é errado.

Isto não é contraditório com a afirmação anterior de que os postulados da educação assentam numa concepção do indivíduo e da sociedade. Mas significa que nenhum postulado é válido em absoluto, independentemente da experiência, da prática, da aplicação. Cabe ao educador ver se ele é válido no campo da educação. Se o não for, tanto pior para tal postulado.»

António José Saraiva, Dicionário Crítico, Gradiva, Lisboa, 1996 (pp. 63-64)

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